Como pensar e fazer “livros” que sejam manifestações de um “outro” e/ou de uma “outra” forma, conceito, linguagem e simultaneamente possam ser o que são, como livros mas também como objetos, gestos, imagens, palavras, pensamentos, instantes e/ou memórias abertas à reflexão: do seu enquadramento artístico, das suas múltiplas definições e do seu estatuto na arte.
Nas primeiras décadas do século passado, a arte renova-se em diferentes movimentos, manifestos e ações, experiências e dinâmicas. Procurando encontrar-se mais próxima das transformações do tempo de agitação e inovação que se vivia na época e potenciando-o, reflectindo sobre ele e/ou tornando-o como referência, trilharam um futuro em aberto. Falamos de um século corrido, de novas práticas, linguagens, com novas abordagens, outras perspectivas e outras reflexões. Que legados temos hoje? Que diferenças e distâncias? Que proximidades e controvérsias?
Neste mundo global, hipereferenciado, conectados a “tudo” e a “todos”, num tempo e espaço quase simultâneos, somos nós ready-mades sem escapatória possível? Praticamente todas as vanguardas lançaram manifestos – textos/programa que divulgavam as propostas das novas formas de expressão artística e definiam estratégias concetuais e formais para alcançá-las em termos de práticas. Todas elas tinham uma intenção comum: romper radicalmente com os princípios que orientavam a produção artística do século XIX. O termos vanguarda tem assim um carácter de ruptura, de choque e de abertura. Ruptura com os valores e princípios do passado; Choque com as expectativas do público; Abertura a novos modos de olhar e interpretar a realidade em permanente estado de transformação.
Duchamp ao expor a sua Fonte, um urinol assinado com o pseudónimo de R.Mutt (conhecido fabricante de sanitários), no Salão dos Independentes, referente também à palavra “mutation” (mutação) e à palavra mudo, de calado, competindo com as obras de outros escultores, traz o ready-made como forma de explicitar as novas relações que se estabelecem actualmente entre produção e artista, produção e recepção especializada e não especializada. Considerando a fonte de Duchamp como a própria expressão de um manifesto, um manifesto objetual e ação, um manifesto carregado da ironia do artista no seu descomprometimento com a própria noção de obra de arte e do seu estatuto? Ou seja, e desde o seu “aparecimento”, ao seu “desaparecimento” até ao “atentado” que sofreu, em 2006, no Centro Pompidou em França, continua esta a gerar diversas manifestações de sentido e de posicionamento crítico que a própria obra em si contém? Se os próprios manifestos podem ser textos, imagens, objectos, se os livros também são ditos como fontes, como registos de momentos que fazem história, então e os livros de artista? Que papel, função, expressão, que lugar, que tempo, que questões, que respostas nos podem trazer?
No dia 12 de Maio, no Museu do Papel, inaugura a exposição que conta com os trabalhos dos alunos do 1º DG, 1º CPM e 3º DG da Escola Artística e Profissional Árvore.
As temáticas abordadas nos trabalhos, de livros de artista, fanzines, cadernos e objetos-livro foram, desde os manifestos das vanguardas artísticas da primeira metade do Século XX, como aos manifestos de carácter social e político, relacionados com princípios e direitos democráticos. Todos procuraram estabelecer uma relação entre a importância da sua construção histórica e a necessidade de os relembrar no presente.Tornando assim as premissas definidoras de conceitos e práticas a eles inerentes, sejam no domínio mais específico das expressões artísticas, sejam no âmbito da vida do dia a dia, mais capazes de serem cumpridas, clarificadas e em simultâneo remanescentes mas adaptadas ao mundo actual.